quinta-feira, 21 de junho de 2012 0 comentários

Contos que não se contam (parte 4)



4.

Era pagar pra ver. Nem que fosse com a vida.

Mas pagar como? Se nem tinha recebido o cachê do trabalho? E, do jeito que a coisa ia, talvez nem recebesse. O ambiente tava carregado! O ar parecia mais grosso. Era difícil respirar ali dentro. E enxergar também...

A casa começou a feder. Carne podre. Muito podre. Carniça completa. Morte. Antiga. E violenta. Eu podia sentir a agonia dos que ali habitavam. Um homem e uma mulher. Casados. Apaixonados. E ela estava grávida. Sete meses. Então foram três mortos. Um deles sem nem saber o que o acertou. A pobre criança ainda sofreu por horas, mesmo após a morte de sua mãe.

Como eu sei disso? Não sei. É o meu dom. Eu vejo a morte e seus rastros. Seus filhos desgarrados, pedindo clemência e o fim de sua agonia. Eu sou... o fim da dor. 

Eu nasci assim. Lembro de quando minha mãe me pariu e todas as outras crianças de outras mães não sobreviveram. Eu me lembro do choro das mulheres na maternidade e o silêncio dos recém-nascidos. Eu me lembro da luz e das sombras lutando pelo local. Ou será que era por mim? Nunca saberei a resposta. Mas eu vi mais do que qualquer ser vivo poderia ver. E isso me forjou o que sou.

Eu não chorei quando nasci. Apenas escutei aquele lamento coletivo, aquela dor materna e aprender com tudo aquilo. E, até agora, deu certo. Estou vivo, certo? Mas aonde vou, a morte está presente. Aqui não seria diferente. 

Olhei ao redor e, o pouco que vi, não me revelou muita coisa. Mas sabia que as respostas estavam mais à frente. No quarto, com a porta entreaberta, quase me provocando, me convidando a entrar e deixar essa vida de sofrimento para trás. Assim como o casal de outrora.

Resolvi aceitar o convite. Correndo o risco de nunca mais voltar. Apenas disse:

- Estou pronto... Mas será que “vocês” estão?

- Sssssssssempre... – Sibilou a escuridão. – Sssssssssiga em frente...



(Guilherme Ramos, 21/06/12, 22h23 A história ganha seu quarto capítulo. O que virá no quinto?)
quarta-feira, 20 de junho de 2012 0 comentários

Contos que não se contam (parte 3)



3.

Que casa mais FRIA! Brrrrr... Só faltava nevar lá dentro! Um absurdo! Mais estranha era a impressão de que o lugar era maior por dentro do que por fora... Mas não... Devia ser a escuridão. Era só impressão.

De repente, uma sombra. Um ruído qualquer. E eu, claro, me assustando a toa. Não devia ser nada. Mas... nada faz barulho? Porra, que sensação de “fudeu” bateu em mim, de repente. Olhei para trás, pensei em voltar... Mas não. A voz de veludo me contratou para limpar essa casa e eu vou limpar. 

Erroneamente, vocês devem estar pensando que sou algum tipo de faxineiro. Não, não sou. Alías, até sou, mas não de poeira, sujeira normal. Eu limpo casas... de almas sebosas. Sim! Sebosas! Aquelas que não se tocaram que a vida acabou pra elas, que elas são apenas vapor de adubo humano, pré-merda astral rumo ao oblívio. Que seu apego as prendeu num canto podre da terra e que eu sou seu instrumento de libertação. As demais... que descansem em paz.

- Merda de casa velha... – Eu me sentia rezando um terço para exorcizar um demônio. É, não surtiria efeito. - Mas que merda eu estou fazendo aqui?

- Q...Q...Quem está aí? – Disse uma vozinha esquisita, vinda do fim do corredor.

Mesmo querendo ficar onde estava, meu corpo foi impelido para a escuridão, num convite irrecusável jamais sentido. Seria a morte me chamando? Ou a coragem inesperada do desespero? Curiosidade? Era pagar pra ver. Nem que fosse com a vida.

(Guilherme Ramos, 20/06/12, 23h19. A terceira parte da história. Está fluindo. Escrita automática é uma loucura. Você não pensa muito. Escreve, escreve, escreve... E a história se cria. Nesse capítulo, fiz muitas modificações do original. Não sei se devia, mas revisei e cortei um pouco do "humor negro" que estava surgindo. Meu estilo é mais sombrio. Até amanhã e até o capítulo 4!)
terça-feira, 19 de junho de 2012 0 comentários

Contos que não se contam (parte 2)



2.

E segui noite a fora; rua à dentro, rumo ao desconhecido... Affff!... Nunca o desconhecido foi tão longe! O tanque da minha moto quase seca! Mas cheguei. E torci para que, na volta, houvesse um posto de gasolina aberto. Senão, teria que empurrar a Virago preta e prata por todo o caminho de volta...

O lugar era bem esquisitinho. Típico filme de terror “B”. Tá, “C”. A casa era muuuuito escrota. Acho que nem tinha energia elétrica. Peguei minha mochila e me aproximei das janelas. Depois da porta. Comecei a observar o lugar. Estava tudo escuro. Não dava pra ver nada! Então, toquei a maçaneta.

- Tem certeza que vai entrar? – disse a voz de veludo, quase soprada, em meu ouvido.

- Porra! Você me assustou! – E me virei. 

A visão foi bem melhor. A voz de veludo tinha um rosto de anjo! Aquilo me animou... Bastante. O que quer que seja o trabalho, ver aquela mulher já pagava o stress.

- Aconselho a abrir sua mente. As coisas aí dentro são bem estranhas. Eu mesma não consigo entrar. Parece coisa de outro mundo...

- De outro mundo é você, meu bem! 

Ah! Não tinha nada a perder mesmo. Só o cachê, claro. Mas estar ali, naquele fim de mundo desgraçado, com aquela mulher valia a pena. E se rolasse um “clima”? Já era lucro, mermão! 

- Deixa de bobagem, meu bem! Vem comigo que você não só vai entrar, como não vai ter mais vontade de sair de lá dentro!

Ela deu um passo para trás. 

- Entre só. Faça o trabalho. Receba. E, se fizer bem feito, pode ter um pouco mais.

- Agora você falou tudo! Já tô entrando!

E assim foi, passo a passo, pé ante pé, sem lanterna nem nada. Só coragem e tesão... E também coração na mão. Que casa mais FRIA! Brrrrr...

(Guilherme Ramos, 19/06/12, 22h25. Atendendo a pedidos... A segunda parte da história. E ainda tem mais por vir! Se vocês quiserem!... Rsss...)
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Contos que não se contam (parte 1)

1.

Sabe o que é foda? O que é foda mesmo? É você sair para mais um “servicinho”, esperando encontrar algo normal, do seu métier e se fuder todo. Tem noção disso? Não? Ah!... Eu devia saber. A pior parte de contar algo para amadores, é que eles jamais alcançarão o cerne de seu conhecimento...

- Estou sendo duro demais com você, baby boy? Oh! Poor baby boy! Poor baby boy!...

Não, não estou sendo cruel com você que me lê... Por que faria isso? Foram palavras de outra pessoa. Se é que posso chamar “aquilo” de “pessoa”.

Tá. O lance foi o seguinte: estava eu, em mais uma noite regada a vodka red bull e, juro por todos os santos, a fim de descanso. Mas, o celular tocava sem parar. Foram mais de 20 chamadas. De um mesmo número. Desconhecido. Realmente não tava a fim de atender. Mas, fazer o que, né? A curiosidade bate e você vacila. E atende a porra do telefone.

- Eu sei que você não quer trabalhar hoje à noite, mas preciso de você. – dizia a voz, suave como um veludo de 600 dólares (o metro!). – no SMS tem meu endereço. E o preço do serviço.

- Putaquepariu!!!! Tudo isso????? Deve ser uma puta de uma roubada! – Gritava minha intuição. Mas eu escutei? Claro que não! E segui noite a fora; rua à dentro, rumo ao desconhecido...

*     *     *

(Guilherme Ramos, num exercício de escrita automática em 19/06/12, 1h54. Fruto de uma insônia que dura dias... E aí? Continuo a escrever esse conto? Rssss...)
terça-feira, 12 de junho de 2012 1 comentários

Com relacionamentos anteriores aprendi...


 
... que o outro já tem problemas demais. Não precisa de seu rancor. Precisa de sua compreensão, de seu perdão e de sua amizade. Não consegue? Tudo bem, talvez você precise disso primeiro.

... que não adianta querer moldar o outro à sua compreensão de perfeição. Ela só deve existir na sua cabeça. É sua idealização. Mas, se existir em outro lugar, é no Mundo das Ideias de Platão.

... que é possível permitir ao outro ser quem ele é. E conviver com isso. Mas com respeito. Mútuo. E empatia. Coloque-se no lugar do outro. E, só depois disso, veja se o que você quer fazer (ou dizer) lhe agradaria. 

... que ciúme é normal. Muito ciúme, gripe. Mas só ciúme, câncer. Terminal.

... que precisamos ser amigos, antes de amantes. Companheirismo e lealdade em primeiríssimo lugar. Fidelidade é conseqüência.

... que beijar na boca é bom, transar é ótimo, mas ter com quem conversar (e partilhar a vida) com tudo isso junto é melhor ainda.

... que não preciso de ninguém (para ser feliz). Preciso é de alguém para dividir a felicidade em seus melhores momentos.

... que nada é em vão. Tudo tem sua razão de ser. Se hoje sou o que sou, foi devido ao que enfrentei no passado. Posso e serei melhor no futuro com o que vivencio no presente. O passado não deve me impedir a ser uma pessoa melhor. O passado é escudo (que nos protege), não uma muralha intransponível (que nos impede de agir).

... que o Dia dos Namorados é só mais uma data comercial (como se tornou o Carnaval, o São João, o Dia das Crianças, o Natal...), que dá mais lucro aos empresários, que aos relacionamentos. A exceção cabe a cada um de nós. 

(Guilherme Ramos, 12/06/2012, 1h11, escrevendo e olhando pela janela do quarto a chuva que cai, numa fria noite do inverno que finalmente se aproxima...)

Discorda? Ótimo! Não quero estar certo, neste caso. O que quis mostrar é que podemos (e devemos) ser a diferença. Porque o mundo já está “globanalizado” demais. Faça a SUA diferença. E tenha um FELIZ DIA DOS NAMORADOS.
segunda-feira, 11 de junho de 2012 0 comentários

Samba da Saudade


E foi num samba que eu cantei a saudade,
Independente da idade com que se amou...
Foram nas suas (tão lindas) rimas-estrofes,
Que eu esqueci das minhas "más sortes",
No caminho que pouca gente trilhou.

Tamborim tocou, cuíca sorriu...
Surdo ficou, o desamor!
Não me pergunte qual hora sutil
Vou declarar o meu amor!

Acordei com o violão, as notas da paixão
E o cavaquinho nos apoiou (o clima esquentou)
O reco-reco, tão futriqueiro, fez divulgação
A bateria, numa explosão, só confirmou!

Investi num flerte de pandeiro,
Declamando pro mundo inteiro
O que meu coração não pode guardar!

A melodia fez-se, no início, à capela
Porque quem ama não espera (e apela)
Para melhor se expressar! (E amar!)

E foi num samba que eu cantei a saudade,
Independente da idade com que se amou...
Foram nas suas (tão lindas) rimas-estrofes,
Que eu esqueci das minhas "más sortes",
No compasso de quem, no amor, se aventurou.

(Guilherme Ramos, 11/06/2012, 13h19. Mais um samba antes do almoço, sem muito esforço, pra variar...)

Imagem: encontrada pelo Google afora. Se alguém se sentir "lesado", pense: é por causa da música, por causa do amor ou... pelos direitos autorais? É só falar que eu retiro daqui. Ficará só a saudade. Rsss...
terça-feira, 5 de junho de 2012 1 comentários

Cáuo*



Minha filha Hannah observa dois automóveis estacionados, no outro lado da rua, enquanto estamos sentados na porta de nossa casa.

- É o cáuo... - diz, num dado momento.

- É. - eu confirmo.

- Tá cortado, o cáuo.

Não consegui segurar o riso. Simplesmente fantástico ouvir isso. Ela se referia ao Fiat Strada que estava ao lado de um Uno Mile. Ao seu ver, cortado. Agora, pôxa, associar "inteiro" e "cortado" ao ver dois veículos? Ai, ai... Ela só tem dois anos! Rssss... Mas vai longe, não vai? Quanto ORGULHO!!!!! Huahuahuahuahua...

(*) Cáuo: carro, no dialeto "Hânnico"...
 
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