Eu me perguntei sobre o
que a chuva estava falando. Ela me parecia agitada, nervosa, descontrolada. Chovia
há três dias. Sem nenhuma pausa. Um sentimento abstrato me ocorreu no exato
momento em que trovejou. Seria aquilo, um aviso de que tudo - entre nós -
piorou?
A chuva é assim mesmo:
vai e vem sem nenhuma compaixão. Tantos reclamam dela na cidade, outros tantos
a desejam no sertão. Mas ela, indiferente, não se compadece. Aparece e
desaparece onde e quando quer. Não se preocupa em agradar a gente. Seja
criança, idoso, homem ou mulher.
Fazia frio. Muito frio.
À cama, cobertores e lençóis brigavam por mim. Travesseiros disputavam minha
presença entre eles, numa relação conflituosa sem precedentes. Era - a cama - a
arena onde se disputava calor, amor, aconchego, sonhos e outras tantas coisas
do dormir. Era - o corpo - desejado pela cama, num desejo que se recusava a
sumir.
Apenas eu e ela não
estávamos lá. Eu estava. Ela, não. Daí, nenhum calor se produzia. Nenhum amor
se perfazia. Nenhum aconchego se trocava. Nenhum sonho se realizava. Nenhum
sono vinha. Não havia dormir. Havia insônia. Uma madrugada inteira de
despertares. E a chuva, lá fora, não apenas observava.
A chuva tentava se
comunicar. Comigo. A janela, entreaberta, recebia sussurros de seus pingos, que
insistentemente caiam dentro de meu quarto. Uma ou outra goteira tecia frases
que eu não podia compreender. O vento trazia o cheiro de terra molhada que me
falava, falava, falava... Mas eu não entendia nada, nada, nada...
Eu me perguntava se o
outono tinha algo a ver com isso. Ou se eram apenas recados do inverno que
havia em mim. Verão e primavera eram estações tropicais demais para o que
estava sentindo. Se eu concordasse com a poesia que havia nelas, eu estaria
mentindo. Havia uma quinta estação. E eu a experimentava a cada noite que,
naquele quarto, com aquela chuva, eu passava.
Só quem não passava era
a chuva. E ela continuaria a chover como chuva porque era de sua natureza
precipitar-se sobre a terra. Como os homens caem sobre suas camas. Algumas, com
boas companhias; outras, vazias. Assim era a chuva lá fora. Falava comigo e eu
não entendia. Talvez por eu saber o que ela queria dizer.
Talvez, só talvez, ao
menos uma vez, eu a tenha compreendido. Escutado, respondido. Talvez nosso
diálogo tenha sido proferido. Mas, talvez tenha sido melhor nos calarmos.
Aceitar o castigo. Chuvas e homens não podem conviver em paz completa. A
qualquer momento, um dos dois há de parar de cair. E, nesse momento, deve seguir
em frente.
Porque é o certo a
fazer.
Porque sempre haverá
uma nova estação.
(Guilherme Ramos, 02/05/2014,
2h40.)
Imagem: Google.
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