segunda-feira, 29 de abril de 2013

Dança



Engraçado que nunca a viu dançar. Mas tinha a certeza de que seus passos seriam os mais incríveis possíveis. A forma como andava, como falava, como sorria com o corpo inteiro, os cabelos soltos ao vento, os olhos brilhantes... Enfim, um conto de fadas ambulante.

Seu corpo era firme. Pernas torneadas – segundo ela, de nascença – cujos exercícios físicos só as valorizaram. Não fazia academia. Somente a dança lhe bastava. Os ensaios, repetidos minuciosamente dia após dia, buscavam a perfeição. E o coração da bailarina só batia por seu ofício. Seu coração só sentia o ritmo da música.

Foi quando o conheceu. Ele, homem de letras, pouco exercício fazia. Não chegava a ser sedentário, mas também não curtia academia. Preferia caminhar. Ao lado dela. Correr, só se fosse para os seus braços. Suas risadas, ainda mais gostosas, formavam um acorde perfeito com as dela, onde a melodia criada era chamada amor. E viveram felizes...

... Mas não para sempre. Ela, tardiamente, descobriu-se impedida de amar mais uma vez. Sua maior paixão – a dança – foi a única que não a decepcionou tempos atrás. E temia por seu coração. E tremia pelo coração do outro. Não queria machucá-lo. Não queria machucar-se. Novamente. Seu passado foi triste o bastante, como uma queda no meio de uma apresentação. Uma fratura exposta, cruel e sem cura. Decidiu afastar-se, fugir dos refletores. E da cena romântica.

Ele partiu para longe. Para dentro de si. Fugiu das lágrimas e da dor. Evitou o clichê. Trancou-se. Escreveu. Recolheu-se. Reescreveu. Desconheceu-se. Escreveu novamente. E ficou bom. O que foi escrito. Ficar bem, ele, bem mesmo, só com o tempo. Era preciso... revigorar-se.

Não havia raiva, rancor ou amenidades sentimentais trevosas. Havia amor. E os dois sabiam. Sentiam. Ainda. À distância. E, sendo amor, não se poderia forçar nada. Se era pra ser, que fosse. Ser não era, foi-se. Foram-se. Tantas chances, ainda, de serem felizes... Mas ninguém parecia enxergar.

Ela poderia compor seus romances, seus poemas, suas aventuras fantásticas, suas inspirações, ser sua musa, sua amada, sua amante, sua melhor amiga e seu eterno instante. Aquele momento, quando não se pensa em mais nada e apenas uma imagem vem à mente: eles, felizes, lado a lado, num tom – e sobretom – sorridente.

Ele poderia enlaçá-la, abraçá-la, rodopiá-la ao som da valsa, do tango ou do ritmo que ela escolhesse. Nem mesmo seria preciso música, pelo simples fato dela, por si só, ser a mais importante, instigante e excitante melodia que a sua vida já presenciou. Então, (re)pensou:

- Dança, mais uma vez, comigo?

(Guilherme Ramos, 29/04/2013, 18h.)

[Mais um conto da série... “Sobre Mulheres e Fêmeas”...] 

Imagem: Google.

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